domingo, 24 de junho de 2007

ENTREVISTA: SAMUEL GACHET

Samuel Gachet é psicólogo e nesta entrevista fala sobre a invisibilidade social, tema da reportagem feita por mim e por Vivian Fernanda Garcia da Costa para o jornal laboratório do Centro Universitário Barão de Mauá e que está postada aqui no blog. Essa discução é de extrema importância, pois vemos cada vez mais a maneira como o preconceito se insere na sociedade brasileira de maneira invisível.

Porque pessoas que pertecem a um "nível social melhor" têm dificuldade em enxergar pessoas que estão em uma "escala social inferior"?
Gachet: O sistema Capitalista sobrevive sob a lei do mais valia onde para que um ganhe, é imediatamente necessário que outro perca. Desse modo a população de baixa renda é vista com um vasto mercado consumidor, e essa é sua única forma de visibilidade. A segregação de minorias sofre uma inversão no aspecto econômico; a maioria da população humana que constitui a “escala social inferior” é vista apenas como um todo, como uma massa enorme com potencial de compra, porque mesmo muitas vezes vivendo em situação de miséria é responsável pela manutenção do mercado e da indústria cultural. Isso faz com que a minoria (rica) seja sectária e a maioria (pobre) seja segregada.Quando os constituintes dessa massa são individualizados, sofrem com a invisibilidade social. Ser invisível é sofrer a indiferença, é não ter importância. Quanto mais a dita classe A se isola em seus benefícios oriundos do capital, mais torna os indivíduos invisíveis; condomínios habitacionais, carros blindados, hospitais e colégios privados, são exemplos clássicos de isolamento da população com poucas “condições financeiras”.

Há algum fator determinante para que se desenvolva essa indiferença emalgumas pessoas, ou seja, o meio social ou cultural influencia na invisibilidadesocial?
G: As pessoas são constantemente influenciadas pelo meio social em que vivem, seus comportamentos são instalados e podem ser repetidos graças as contingências em que o indivíduo ou grupo social está exposto, e esse indivíduo e/ ou grupo social podem interagir com seu meio social. O problema ocorre quando grupos sociais começam estabelecer comportamentos supersticiosos e preconceituosos, como as afirmações de que “pobre é vagabundo” e que os “médicos são superiores”.Não há um único fator determinante, mas diversas práticas culturais, em sua maioria ligadas a fatores econômicos: “não compensa olhar para os invisíveis”Interessante frisar, que os indivíduos são invisíveis mas o grupo ao qual pertencem constituem nicho mercadológico em potencial como por exemplo a “indústria da seca” no nordeste brasileiro e a “indústria da violência” nos grandes centros urbanos.

Existe uma faixa etária em que a invisibilidade social ocorre com maiorintensidade?
G: A invisibilidade social atinge principalmente indivíduos que não pertencem ainda, ou não pertencem mais ao mercado de trabalho, ou seja, crianças, adolescentes e idosos.A indiferença é ainda potencializada pela classe social menos favorecida, por exemplo, crianças e idosos pobres e pelas condições de vida, como crianças e idosos pobres em situação de rua.O Brasil teve grandes avanços com a criação dos Estatutos do Idoso e da Criança e do Adolescente (ECA), mas os mecanismos de efetivação de direitos ainda são falhos e a indiferença já está tão estabelecida e enraizada que os próprios seres de direitos não conseguem se impor, mesmo com um código de leis em mãos.O preconceito que gera invisibilidade se estende a tudo o que está fora dos padrões de vida das classes sectárias, e vai muito além das questões de idade. Muitos são os indivíduos que sofrem com a invisibilidade social, como por exemplo, profissionais do sexo, pedintes, usuários de drogas, trabalhadores rurais, portadores de necessidades especiais, homossexuais, etc.O indivíduo culturalmente cego (que não vê os invisíveis) transita e se mistura constantemente com os invisíveis, mas ignora seu potencial transformador e sua capacidade de aceitação e entendimento.

De que maneira a vida das pessoas que são vistas como "invisíveis" é mudada por causa dessa indiferença?
G: Buscamos constantemente reforçadores sociais, queremos ser notados e receber algo em troca do que fazemos. “Aparecer” é ser importante para a espécie humana, ser valorizado de alguma forma é parte integrante de nossa passagem pela vida, temos que ser alguém, um bom profissional, um bom estudante, um bom pai, uma boa mãe, enfim, desempenhar com louvor algum papel social. A invisibilidade social causa um bloqueio nessa conquista, “não sou notado por ninguém, logo buscarei outros reforçadores”.Assim, a invisibilidade social pode levar a processos depressivos, de abandono e de aceitação da condição de “ninguém”, mas também pode levar a mobilização e organização da massa segregada. Assim vemos esses antônimos em nosso cotidiano, ou se é organizado para conseguir visibilidade ou se está fadado a um futuro sem ideais.Temos centenas de exemplos de organizações de invisíveis em nossa nação. O Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), a Central Única de Favelas (CUFA), Fóruns Nacionais, Estaduais e Municipais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, os Conselhos do Idoso, o Movimento GLBTT (Diversidade Sexual) e outros mostram que muitos que antes eram apenas vistos como uma massa consumidora agora ganham espaço como seres de direitos.Outras formas também organizadas, porém violentas são ainda reflexo da invisibilidade social, como o crime organizado (PCC e CV) e as rebeliões em unidades da FEBEM, isso prova que a invisibilidade social não afeta e transforma apenas a vida das vítimas, afeta também a vida dos vitimizadores, os “cegos”.A invisibilidade social já está cotidianamente estabelecida e estamos de uma forma devastadora nos acostumando a ela, passar por um pedinte na rua ou observar uma criança “cheirando cola” em uma esquina é algo corriqueiro em nossas vidas e aceitar isso é fraturar os direitos humanos, é preciso não só “ver” esses invisíveis, mas é preciso “olhar” para eles e “sentir”junto com eles, é preciso “colocar óculos em toda humanidade”.

Um comentário:

Unknown disse...

BOA TARDE,
DO TEMA EM PAUTA PRECISO FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA PARA REFERENCIAR UM TRABALHO RELACIONADO COM INVISIBILIDADE SOCIAL. MUITO OBRIGADO